terça-feira, 3 de julho de 2012

Primeiro RPG para computador faz 30 anos

Alguns traços brancos numa tela preta, representando uma sala num labirinto, e bonequinhos mal alinhavados como monstros e esqueletos. Isso era o máximo de gráficos que se podia ter num role-playing game (RPG) rodando num computador Apple II. Não admira: o ano era 1980, e o game era "Akalabeth: World of Doom" - o primeiro RPG portado para o computador. Ele teve alguns antecessores, como "Dungeons", mas no fim das contas acabou sendo a inspiração do clássico "Ultima", lançado no ano seguinte, que inspiraria outros RPGs, como os criados para os consoles nipônicos (nesse campo, um dos pioneiros foi "Dragon Warrior", o primeiro da série "Dragon Quest"). Inclusive, "Akalabeth" e "Ultima" são do mesmo autor, o programador britânico Richard Allen Garriott.

A inteligência artificial, cada vez mais presente nos jogos, ajuda a tornar o jogo menos determinístico
Até então, os RPGs para computador eram feitos em modo texto, isto é, o jogador interagia com a máquina escrevendo suas ações ao longo da aventura, como em "Colossal Cave Adventure". Tentava-se levar para o mundo digital a magia dos RPGs ao vivo, em que jogadores viviam uma aventura em suas mentes apoiados por mapas, cartas, dados e miniaturas de guerreiros, magos e monstros. "Akalabeth" foi o primeiro a mostrar isso com gráficos, ainda que toscos, e atraiu bastante atenção (foi inclusive portado para o sistema DOS). Vendeu dezenas de milhares de cópias e deu a Garriott alento para novas criações. No fim das contas, a série "Ultima" fez tanto sucesso que ele chegou a ter sua própria produtora de games.

- Os RPGs sempre foram difíceis de implementar como games de computador, porque nesse tipo de jogo o fator humano é fundamental, até pela presença de um mestre, da necessidade de criatividade etc - lembra Esteban Gonzalez Clua, professor do Instituto de Computação da Universidade Federal Fluminense (UFF) e gerente do Media Lab. - Algo complexo de replicar numa máquina. E, historicamente, os RPGs de computador sempre foram muito rígidos, pré-determinísticos (ou seja, se você faz A, acontece B, que causa C e assim por diante). Durante muito tempo, quem era jogador de RPGs ao vivo teve preconceito quanto aos RPGs de computador ou console.

De fato, criatividade não falta em se tratando de role-play. Se o "Akalabeth" foi inspirado pelo célebre RPG de papel "Dungeons & Dragons" e pelas obras de J. R. R. Tolkien (autor de "O Senhor dos Anéis"), a trilha que leva à origem dos RPGs de papel se mostra bem mais longa. O primeiro de que se tem notícia surgiu em 1967, baseado num cenário das guerras napoleônicas, mas foi inspirado no jogo de estratégia dos anos 50 "Diplomacy" (em que os governantes dos países do game precisam interagir politicamente) e, em última análise, no "Kriegsspiel" ("jogo da guerra" em alemão), inventado há aproximadamente 200 anos na Prússia para simular batalhas.

Muitos RPGs de computador depois do pioneiro, a rigidez da máquina foi vencida com o advento dos MMORPGs, os role-playing games jogados através da internet, em que o fator humano voltou a dar as caras.

- Além disso, a inteligência artificial, cada vez mais presente nos jogos, ajuda a tornar o jogo menos determinístico - diz Esteban. - O game fica mais adaptável a situações e pode até pode "criar" algumas.

Abelardo Pinto, programador e professor de desenvolvimento de games num dos cursos preparatórios da Technology & Training, lembra que ele mesmo ficou imerso durante um bom tempo no universo de "World of Warcraft". E conta que, do ponto de vista da programação, bolar um RPG de computador é uma tarefa realmente hercúlea.

- Ã preciso levar em conta um sem-número de situações e atributos possíveis, e procuro passar isso aos estudantes - diz Abelardo.

O futuro dos RPGs digitais pode estar numa das vertentes mais badaladas do mundo dos jogos eletrônicos hoje em dia: a chamada narrativa interativa, feita pelo próprio computador.

- Pense em algoritmos computacionais que, a partir de uma base de dados, sejam capazes de inferir e criar histórias, usando inteligência artificial - diz Esteban. - Hoje há congressos científicos dedicados só a isso.

Pelo jeito, ainda há no horizonte muitos mundos a serem inventados e aventuras a serem vividas.

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